quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

De São Paulo a Belém



Deu um arrocho no peito, São Paulo ficou pequena, ô lugarzinho abafado!

Fomos convocados para uma viagem a Belém. A primeira parada seria em Araxá-MG, depois seguindo milhares de quilômetros ao norte, para descarregar o restante da mercadoria em Marabá-PA e, centenas de quilômetros mais para cima, em Ananindeua-PA (Região Metropolitana de Belém), para coletar equipamentos e trazer de volta para São Paulo. Olhamos no mapa e sentimos que agora o trem arrochou: dois terços do território brasileiro, em linha reta, separam a capital paulista da paraense.

No feriado de finados, carregamos a Sprinter para mais essa jornada. Eram seis caixas grandes com equipamentos hospitaleres. Almoçamos em casa com a família do Tonho que tinha vindo nos visitar (Golias e Dra. Myrthes) e seguimos para mais essa jornada.

Pegamos a via Anhanguera - estrada bandeirante que desbravou o Brasil, rasgando território, cerrado e seus povos! Quando passamos em Campinas, dava pena, dava dó. No trevo de Americana, sentimos que íamos aguentar. De Limeira até Araras, tocando sem parar. Uma parada em Leme, uma boa ideia em Pirassununga e passamos sem parar por Ribeirão.

De Uberaba a Uberlândia fomos acontemplando a beleza, dando um tapa na cidade, ouvindo moda sertaneja! Entre as duas cidades, desviamos para Araxá-MG, nosso primeiro destino. Já era noite, quando pegamos a estrada saindo da Anhanguera, em meio a um enxame de insetos que dava cada estouro na frente do caminhão, que tivemos que parar num posto para lavar o pára-brisa.

Chegamos em Araxá por volta das 22h, do dia 02 de novembro. Ficamos no Hotel Catuíra, próximo a rodoviária, pousada mais em conta que encontramos e que para nós estava passando de bão!

No primeiro horário da terça-feira (03/11), fomos descarregar no cliente. Rodamos um pouco perdidos, porque havia dois endereços com o mesmo nome na cidade. Encontrado o endereço, uma clínica próxima ao nosso hotel, rapidamente descarregamos. Aproveitamos para dar uma volta no centro antigo de Araxá, uma viagem no tempo da Dona Beija (que, como o avô Luizinho das moças dizia, foi a responsável por roubar o triângulo de Goiás).



De volta na estrada, deixamos Minas para trás, cruzando o Paranaíba, na altura de Itumbiara. No trevo de Morrinhos, para encontrar Goiânia, cheios de esperança. Abastecemos no Aparecidão (Marajó), posto imenso com caminhões seguindo para todo o Brasil. Dormimos na casa da vó Myrthes, comemos pamonha e mesmo na correria, conseguimos curtir um pouquinho da família do Tonho.

E se na linda Goiânia, se não encontrar ninguém, amanhã bem cedo seguimos com destino à Belém, vamos até o fim do mundo, com nosso bem!


De madrugada saímos da capital goiana, por Nerópolis, e antes um pouco de Jaraguá, pegamos a BR-153 - a famosa Transbrasiliana, ou Belém-Brasília, principal eixo de ligação do norte com o centro-sul do país. Daí para cima, a estrada deixou de ser duplicada, lotada de caminhão, mas em geral está boa, sem buracos, ainda que com alguns pedaços o asfalto esteja bem irregular. Além disso, ganhamos 1 hora, já que no norte também não tem horário de verão.

A Transbrasiliana cruza Tocantins de rabo ao bico. Na beira das estradas, os flamboyants tinham um vermelho intenso e os pequizeiros estavam carregados. Passando por Gurupi-TO, demos carona para uma senhorinha, dona Lúcia, que tinha ido fazer um exame médico. Ela nos contou a história de uma moça que morava no Pará, que era muito reprimida e apanhava do marido. Um dia, Lúcia foi visitar uns parentes e, vendo a situação da moça, trouxe ela escondida e fugida para o Tocantins, onde viveu muito tempo trabalhando no seu restaurante. Um dia, conheceu um caminhoneiro gente fina, apaixonou, casou outra vez e mudou para São Paulo. A moça aprendeu a dirigir caminhão e hoje dirige carreta, como seu marido. Toda vez que passa pelo Tocantins, a moça visita Dona Lúcia, a quem é eternamente grata e chama de mãe. Lúcia desceu em Santa Teresa do Tocantins-TO, agradecendo muito e prometendo rezar pela nossa viagem.


O sol estava se pondo, quando passávamos por Fortaleza do Tabocão-TO. Decidimos dormir por lá, para não rodar a noite. Paramos na única pousadinha na estrada, chamada Vitória, quando notamos que o pneu se esvaziava rapidamente. Foi o tempo de chegar no posto do lado, o pneu já estava no chão. Na borracharia, colocamos o estepe e jantamos pastéis de queijo, antes de voltar para a pousada.

Dia 05 de novembro acordamos 06h30 e amanhecemos na cidade de Guaraí -TO, onde compramos dois pneus para seguir viagem. A 153 continuou até Araguaína-TO, onde saímos para oeste, na TO-164. Se antes, os caminhões eram infinitos, essa estrada do Tocantins nos deu a impressão de estarmos indo para um lugar muito longe. Era um estradão deserto, sem caminhão, sem carro, sem posto, sem cidade, nada. Uma espécie de terra de ninguém, o que justamente nos atraía nela. Nós, que não tínhamos almoçado, custamos a achar um povoado, onde conseguimos comer um enroladinho de queijo de desjejum. Em Xambioá-TO, alcançamos a ponta do bico-do-papagaio, com o imponente Araguaia na nossa frente. Subimos na balsa, nosso caminhão navegou o Araguaia e, enfim, chegamos no Pará.


https://youtu.be/lt7pWq8COR4



Saímos da balsa, na Transamazônica. A primeira cidade do Pará que passamos foi São Domingos do Araguaia. Ficamos impressionados quando percebemos não apenas o tanto de motos, mas especialmente que a população não usa capacete e ignora os limites de passageiros! 
Daí pegamos a Transamazônica. Estávamos quase chegando em Marabá, nosso próximo destino, quando paramos no posto fiscal da Secretaria da Fazenda do estado. Eles não devolviam a nota, deram um chá de cadeira e por fim chamaram o Tonho e informaram que o cliente estava com a inscrição estadual suspensa. Arranjaram um monte de problemas e disseram que a carga teria que ficar apreendida até o comprador regularizar o problema. Já era o final da quinta-feira, o que indicava que o problema não estaria resolvido tão cedo... por sorte, a Fran tinha primos na cidade. Ligamos para sua prima Vanessa Rebelo, que foi nos salvar, com seu marido Rodrigo e seu filho João Gabriel.
Passamos um total de seis dias em Marabá. Só na terça-feira (10/11) o cliente resolveu o problema e podemos recuperar o caminhão, que ficou no pátio da Secretaria da Fazenda, e fazer a entrega. Foi quase uma semana tentando entender e resolver o problema, buscando o cliente e enfrentando cada situação atrapalhada que nem pode ser dita aqui neste blog.






   




 



Para ser bem sincerxs, nós adoramos ficar tantos dias em Marabá. Vanessa e sua família nos recebeu tão bem, que até esquecemos os problemas! Muitíssimo obrigado!

Nos divertimos tanto formando banda e tocando com o João Gabriel! Passeamos bastante na cidade. Fomos a vários restaurantes e conhecemos a culinária especial do Pará: açaí, guaraná, tacacá, tucupi... Ficamos viciados no jambu, uma erva deliciosa que adormece a boca inteira! A Fran chegou a experimentar a maniçoba. Tudo bem acompanhado com uma Cerpa bem gelada!

Para vencer o calor de Marabá - onde ar condicionado não é artigo de luxo - nós atravessamos o Araguaia até um banco de areia e ficamos tomando cerveja dentro d'água, literalmente, ao som de technobrega, Wesley Safadão, Simone e Simaria...

E bem cedo na quarta (11/11) seguimos com destino a Belém... Na saída de Marabá demos carona para uma estudante de pedagogia, para a escola rural que ela faz estágio. O almoço foi uma macarronada em Tailândia. Uma ponte caiu na PA-150 e a travessia  do rio Moju teve que ser feita por balsa, gratuita. Uns 50 km mais adiante, em Arapari, mais uma vez pegamos uma balsa, para cortar caminho. É 1 hora e meia de viagem de barco em meio a uma paisagem deslubrante e rios do tamanho de mar. Enfim, no horizonte, Belém.









Chegamos em Belém por volta das 18 horas e atravessamos o centro até a parte antiga da cidade, em busca de local para ficar e guardar a Sprinter. Ficamos no Hostel Amazônia, instalado em um sobrado colonial amarelo. Fomos recebidos com goles de cachaça de jambu, para adormecer a boca e esquentar o espírito, depois da viagem e da busca cansativa por estacionamento para o caminhão. Tomamos banho e saímos pelas ruas apertadas do antigo centro de Belém. 

Ficamos encantados pela cidade. As ruas de Belém são até escuras, devido à sombra das enormes mangueiras, carregadas de mangas, que dão em cachos. Naquela noite fomos à estação das Docas, uma região portuária reformada em um centro cultural e comercial. Lá tomamos um chopp escuro de açaí maravilhoso, acompanhado com queijo de búfala da ilha do Marajó na chapa. Um pianista tocava sobre as mesas, suspenso por um guindaste. Estava uma noite muito agradável, na orla do rio.

Na quinta-feira (12/11) , acordamos bem cedo, tiramos o caminhão do estacionamento, caminhamos entre os camelôs nas ruas apertadas e seus palecetes coloniais coloridos.  Tomamos café da manhã por ali e fomos ao mercado Ver-o-peso, comprar castanhas-do-pará.





   



Seguimos para nosso destino em Ananindeua, na região metropolitana, passando na avenida em frente ao estádio do Mangueirão. Estávamos com dificuldade para encontrar o endereço, pois os números não seguiam uma ordem. Ligamos para o cliente e logo chegamos no endereço correto. Era um distribuidor de produtos hospitalares. Nós estávamos com o baú vazio e lá carregamos quatro máquinas para trazer de volta para São Paulo. Tivemos que fazer certo esforço, porque os equipamentos não estavam separados, mas depois de tantos dias de viagem, a coleta do material foi bem rápida e logo já estávamos prontos para botar o caminhão de volta para casa. Iríamos voltar por um caminho mais direto, não precisávamos desviar para Marabá. Ananindeua já fica na saída da Transbrasiliana, o que agilizou nosso retorno.


Ok, descarregamos com êxito e já podíamos voltar para São Paulo. Porém, nossa história ainda estava longe de terminar. Vai vendo...

Logo depois do almoço, na principal estrada de saída de Belém, paramos num engarrafamento e vimos que os carros estavam saindo com pressa por um atalho à direita da pista. Chegando mais perto, vimos num posto vários carros da polícia federal e policiais com fuzis fazendo um cerco, mandando todo mundo passar rápido e parando algumas pessoas. Assustados, cortamos logo pelo atalho e fomos volta para a pista mais adiante, depois do engarrafamento. Pensamos que poderia ser bloqueios da greve dos caminhoneiros, que andavam dizendo por aí. No outro dia, pela televisão, descobrimos que se tratava de fuga de presos de um presídio próximo, que roubaram uma caminhonete, fizeram vítimas e rolou tiroteio. Nessa noite, paramos em uma pousada na beira da estrada em Ipixuna do Pará e comemos uma pizza antes de dormir.

Na sexta-feira 13, o dia já começou com a Sprinter dando problema - o mesmo defeito que havia dado em Santos e na Bahia! O caminhão perdeu força e a luz da injeção começou a piscar... entramos em contato com a transportadora, que nos orientou a parar numa concessionária em Imperatriz do Maranhão. Mas antes de conseguirmos chegar lá, no posto fiscal na fronteira do Pará, fomos novamente parados, alegando problema na nota de devolução da carga que carregávamos! Dessa vez, porém, temíamos ter que passar o fim de semana numa cidadezinha de algumas centenas de habitantes (Itinga do Pará), por conta da má vontade (ou intenções escusas) do funcionário daquela fronteira. Começamos a ligar para a transportadora, para o cliente e falamos com todo o escalão da burocracia do posto fiscal, até que por fim, o chefe geral disse aceitar uma declaração que o cliente fez e mandou por e-mail. Perdemos mais de três horas naquela brincadeira, mas conseguimos ser liberados para seguir viagem para o Maranhão.

Aliviados, passamos por Açailândia-MA e chegamos no meio da tarde em Imperatriz-MA. Na concessionária, o mecânico passou o caminhão no comptuador de diagnóstico e conseguiu resolver o problema (pelo menos temporiaramente). Depois de mais algumas horas perdidas, podíamos seguir a viagem. Paramos numa cidadezinha próxima de Imperatriz, chamada Governador Edison Lobão-MA. Perguntamos num posto onde poderíamos comer um lanche e custamos a entender no sotaque maranhense o nome do local: Good Lanches. Comemos um sanduíche delicioso e voltamos para descansar no hotel Goiás.

Ainda estava escuro, quando voltamos à estrada, no sábado (14/11). Quando cruzamos a fronteira do Tocantins, nos sentimos quase em casa. Os piquis que carregavam os piquizeiros na vinda, agora já eram vendidos na beira das estradas. Nesse sábado, cruzamos Tocantins inteiro e à noitinha paramos para dormir em Talismã - última cidade do estado.

https://www.youtube.com/watch?v=oVkbuhZ4dog




No domingo (15/11) a pressa para chegar em Goiânia era tanta, que confiamos que o tanque de combustível era o suficiente e quase ficamos sem diesel na beira da estrada. Quando entrou na reserva, em Jaraguá, nenhum posto apareceu pelo caminho e conseguimos com muito custo chegar em Anápolis. Com o tanque cheio, chegamos em tempo de almoçar na casa da vó Myrthes. Que alívio rever a família! Deu tempo ainda de tomar uma cerveja no setor aeroporto com Rafael, Carlinha e Alê, e ainda comer um pit dog para fechar a noite.


Na segunda-feira (16/11), buscamos nosso amigo Vinícius para dar carona para São Paulo. Depois de rodar tantos quilômetros, durante duas semanas, o último dia da viagem foi como dirigir em casa, ainda mais com a companhia do nosso grande amigo. Chegamos no fim do dia em Jacareí, mas ainda em tempo de tomar uma cerveja em homenagem a nossa jornada, apesar de tudo, concluída com sucesso!



Destino: Araxá - MG, Marabá - PA e Ananindeua - PA
Carga: Equipamentos hospitalares
Distância percorrida, ida e volta: 6.100 km








4 comentários:

  1. Foi uma semana top com vcs aqui em nossa casa!! Deixaram saudades!!

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  2. Foi uma semana top com vcs aqui em nossa casa!! Deixaram saudades!!

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  3. Que coisa gostosa é ler esse relato!eu nao vejo a hora da gente explorar o sertão baiano juntos! Saudades

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